O apoio do PT a Sarney não deveria surpreender as esquerdas brasileiras.
Afinal, não é de hoje que rifamos nossos sonhos. E que, até certo ponto, nos igualamos a tudo o que pretendíamos combater...
A luta pelo Poder, para conquistar e manter o Poder, tem nos levado a escolhas de que jamais suspeitaríamos, há uns 30 anos.
O tempo, impiedoso como ele só, nos mostrou que por mais que vendêssemos camisetas e brochinhos jamais conseguiríamos bancar as milionárias campanhas eleitorais.
Ensinou-nos, em suma, a intransponível necessidade de uma “acumulação primitiva não-contabilizada de capital”...
Nada assim tão diferente do que se poderia imaginar num país dominado por oligarquias; num país escravagista como é o caso do Brasil.
Tal processo, é claro, teve, também, bons momentos.
Pois, que também nos mostrou a necessidade – essa sim democrática – de negociarmos com os diversos partidos e o empresariado.
Afinal, todos eles democraticamente representativos de parcelas da nossa população.
O que me preocupa, no entanto, são os limites dessa caminhada, se é que os conseguimos enxergar.
Ora, lutar pela Democracia numa ditadura é infinitamente mais simples.
Numa ditadura, um amplo leque social tem o mesmíssimo objetivo imediato e a própria conjuntura restringe as alternativas de negociação.
Em outras palavras: além de termos uma convergência de ideais, o leque de passos que teremos de dar para trás, para avançarmos dois ou três mais adiante, é bem mais restrito.
Numa Democracia, no entanto, os ideais imediatos se pulverizam e o leque de movimentações, tendo em vista o futuro, o objetivo maior, é quase infinito.
E o meu medo é justamente este: que neste “meião”, em que lutamos por um “objetivo maior” acabemos por perder toda noção de ética, de honestidade; os parâmetros comportamentais que, afinal, fazem a diferença entre “nós” e “eles”...
É certo que temos de negociar com essas oligarquias, como os Sarney e os Barbalho.
Pragmaticamente, temos de negociar...
E não me venham dizer que elas resistem, apenas, pela pobreza e ignorância do nosso povo.
Pera lá!... Há bem mais aí do que pobreza e ignorância.
Na base de sustentação dessas oligarquias há, sim, pobreza e ignorância.
Mas, há, também – e, talvez, principalmente – um elemento não perfeitamente definido que parece ter a ver com carências da própria espécie humana.
Afinal, se o problema fosse apenas pobreza e ignorância não teríamos o sucesso dessa fórmula do “paizinho” do “chefe-durão- mas- que- cuida- de- nós” mesmo nas nações com muito maior experiência democrática que a nossa.
E tal sucesso não teria a universalidade que, de fato, tem. Nem a constância histórica que, de fato, tem.
Então, há alguma coisa aí, sim, de simbólica, de “arquetípica”.
Quer dizer: os Sarney e os Barbalho não encarnam, apenas, um papel contemporâneo de dominação. Na verdade, resgatam necessidades ancestrais por um “guia”, um “Messias”, um “Protetor”...
(Égua, eu tô voando alto, né?... É a cachaça, maninhos!...)
É certo que já conseguimos lidar com esses arquétipos; que já conseguimos, através do marketing, adentrar no imaginário coletivo, para realizar a mesmíssima manipulação das massas que as oligarquias realizam.
E isso nunca deixou de ser problemático, uma vez que nos pretendíamos “pedagógicos”, né mermo?
Ou seja: essa já foi uma concessão e tanto; transformar o “companheiro” Lula em mais um “paizinho” já foi uma concessão e tanto das esquerdas brasileiras.
Assim como foi uma concessão e tanto administrarmos, tucanos e petistas, o “apetite” dessas oligarquias, eis que jamais conseguimos prescindir delas, para a conquista e manutenção do Poder.
E o que me preocupa é até onde poderemos ir.
Deixando de lado a hipocrisia e essa briga infantil do PSDB com o PT pelo troféu do “mais-mais da Ética”, a verdade é que, se estivessem no governo, os tucanos estariam fazendo a mesmíssima coisa que os petistas, nessa coisa (que dá até uma dor no peito!) de apoiar o Sarney.
Fosse o Fernando Henrique, o Serra, o Aécio, no lugar do Lula ou da Dilma, o resultado seria o mesmíssimo: o oligarca José Sarney, que representa o que de pior existe neste país, estaria recebendo todo tipo de afagos e de solidariedade.
Louve-se, portanto, a clareza desses cinco companheiros petistas do Senado que têm batido o pé contra esse “pragmatismo” – ou seria entrega? – de todos nós.
Louve-se a firmeza com que esses cinco companheiros têm tentado encontrar esses limites de que falei.
Se irão até o fim é uma incógnita – afinal, os interesses partidários sempre se sobrepõem às convicções individuais...
Mas é de extrema importância que pelo menos alguns de nós comecem a perguntar, em alto e bom som: até onde podemos ir?
O que, afinal, podemos negociar, sem que isso implique negociar tudo o que sonhamos para este Pará e este Brasil.
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