Sexta-feira, Maio 29, 2009
Hangar
Presidente do Conselho Administrativotambém fornece produtos ao Hangar
A empresária Thaís Montenegro, sócia da gráfica Delta, não foi a única integrante do Conselho de Administração do Hangar a fornecer serviços aquele centro de convenções.Hoje, a reportagem descobriu que o próprio presidente do Conselho de Administração, o empresário Roberto Ferreira, também forneceu produtos ao Hangar.Sócio da Sol Informática, Ferreira vendeu ao Hangar R$ 221.045,00, entre maio de 2007 e o mês passado.Maior centro de convenções do Norte do País, o Hangar é uma estrutura pública cuja administração foi repassada à Via Amazônia, uma Organização Social (OS) presidida pela pedagoga Joana Pessoa, ex-concunhada e ex-assessora da governadora do Pará, Ana Júlia Carepa.Entre meados de 2007 e o final do ano passado, vários órgãos do governo estadual destinaram ao Hangar, através de contratos, mais de R$ 25 milhões, a maior parte sem licitação.Na primeira reportagem dessa série sobre o Hangar, um procurador, um promotor de Justiça e dois advogados de grandes bancas de Belém consideraram incompatível esse duplo papel de empresários que, além de integrarem a cúpula do Hangar, também fornecem produtos ao mesmíssimo centro de convenções.Não houve consenso quanto à existência de crime. Mas, eles foram unânimes em afirmar que essa prática atenta contra princípios constitucionais, como a moralidade e a impessoalidade, que norteiam a administração pública.Ação entre amigos
Hoje, a reportagem ouviu mais um promotor e dois advogados, sobre o caso específico do presidente do Conselho de Administração do Hangar. Eles foram pelo mesmo caminho dos entrevistados anteriores.
“Isso fere o princípio da moralidade” – disse o promotor –“Não tem como: se ele (Ferreira) está vinculado ao conselho de um órgão, teria de estar isento da comercialização”.
E acrescentou: “Não importa o valor, ele não deveria participar desse processo de vendas. Isso fere de morte toda a seriedade da organização social. Se ele quisesse negociar com a OS, tinha de se afastar imediatamente”.
A reportagem perguntou ao promotor se o fato configura crime. Ele respondeu: “Não deixa de ser uma fraude. Embora não haja obrigatoriedade de processo licitatório, os princípios constitucionais são uma fonte muito forte do Direito. Eles são a base, são mais importantes, têm mais força que a própria Lei”.
O promotor apontou o trabalho social realizado pela empresa – a Sol Informática tem inúmeras ações nessa área, inclusive na recuperação de praças da capital e de incentivo a artistas paraenses. Mas, observou, “não há como não dizer” que o fornecimento de serviços pela empresa ao Hangar “não é irregular”.
E arrematou: “acredito, infelizmente, que é improbidade. Quando uma conduta afronta princípios constitucionais, entre eles o da moralidade, o caso já se enquadra em improbidade administrativa. Nem precisa haver o enriquecimento ilícito: basta ferir um dos princípios constitucionais da administração pública”.
Disse, no entanto, que não cabe uma ação popular, já que houve efetivamente o fornecimento dos produtos e inexistiu, pelo menos aparentemente, prejuízo ao erário. “A ação pode ser por improbidade e, talvez, até Penal”, explicou.
Um dos advogados ouvidos pela reportagem lembrou que quem exerce função pública não pode fornecer produtos ou serviços à administração pública. Observou que as OS não têm, apenas, uma natureza privada. E disse acreditar que a impessoalidade e a probidade administrativas “alcançam”, sim, as OS.
Outro advogado considera que a situação de Ferreira é ainda pior que a de Thaís Montenegro:
_ “Isso mostra que existe uma mesclagem moral. Ele (Ferreira) é presidente do Conselho e, ao mesmo tempo, fornecedor. Isso é, no mínimo, embaraçoso. Como é que vai se auto-investigar? Virou uma ação entre amigos!... Ou, como diz o ministro Marco Aurélio (ex-presidente do Supremo Tribunal Federal), ‘farinha pouca, meu pirão primeiro”.
Empresário nega acusações
Mas o empresário Roberto Ferreira nega quaisquer irregularidades na venda de produtos ao Hangar, pela Sol Informática.
“Creio que são coisas distintas” – disse Ferreira – “Se fosse um valor acima do que a praça vende, mereceria críticas. Mas, os preços estão até abaixo disso; vendi mais barato até para colaborar. E isso elimina qualquer hipótese de dizer que houve qualquer benefício”.
Segundo Ferreira, os produtos fornecidos ao Hangar ficaram 5% mais baratos do que os preços de mercado vigentes naquela época.
Ele também informou que o faturamento da Sol atingiu, no ano passado, mais de R$ 83,8 milhões, o que dá R$ 275 mil/dia, em média, considerados os 305 dias úteis do ano passado.
Observou que só um dia de faturamento da empresa é superior a tudo o que foi fornecido ao Hangar, nesses dois anos. E salientou: “Isso é muito pouco para sujar a minha imagem. Não preciso do Hangar e nem do trabalho que faço lá, para me destacar. Preciso disso é como cidadão, para contribuir para a sociedade”.
Ferreira também disse que a Sol realizou a convenção dela no Hangar e que pagou os R$ 6 mil do aluguel de uma sala, para o evento, “como qualquer cliente”.
Lembrou que a empresa recolhe, em média, R$ 457 mil por mês de imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
Além disso, apoiou, no ano passado, 147 projetos em diversas áreas (música, dança, teatro, literatura e obras sociais). E gastou com eles mais de R$ 250 mil, sem dedução de impostos.
EDITORIAL
A Mulher de César
Gostaria de dizer, em primeiro lugar, aos leitores deste blog, que a reportagem acima, embora curta, foi uma das mais angustiantes que já escrevi.
Primeiro pela extraordinária trajetória do empresário Roberto Ferreira, ex-engraxate, ex-mecânico de automóveis, ex-jornaleiro, ex-picolezeiro, que, como ele mesmo conta, não teve tempo sequer “de ser um rebelde”, tamanho o aperto financeiro que enfrentou ao longo da vida.
Segundo, porque a empresa que ele dirige, a Sol Informática, possui, efetivamente, um importante trabalho na área da cultura e da assistência social.
Além disso, o empresário forneceu todas as informações possíveis – as solicitadas ou não. Foi, em suma, extremamente transparente.
Quer dizer: parece-me que Roberto Ferreira é, de fato, um cidadão que faz por merecer o respeito de cada um de nós.
Talvez por isso, passei o dia inteiro com uma historinha a me martelar a cabeça.
Ela é mais ou menos assim.
Pompéia, esposa de Júlio César, era uma mulher digníssima.
O problema é que havia um sujeito apaixonado por ela, um tal de Clodius, que queria porque queria dormir com a bela Pompéia.
Certo dia, Clodius conseguiu se esgueirar até os aposentos de Pompéia.
No entanto, para seu azar, foi descoberto.
Foi um fuzuê danado em toda a Roma. E César acabou por se divorciar de Pompéia.
Tempos depois, alguém perguntou a ele, que, talvez, andasse meio que macambúzio: “Mas, vem cá, César, tu acreditas mesmo que a Pompéia te traía com aquele desqualificado do Clodius?
E César, peremptório: não!
Aí, o sujeito coçou a cabeça, coçou a cabeça e retrucou: “Então, por que, caramba, te separaste dela?
E César disse, então, uma frase que ficaria para a posteridade e que é mais ou menos assim: “Porque à mulher de César não basta, apenas, ser honesta; ela tem, sobretudo, de PARECER honesta!”.
É certo que o enorme faturamento da Sol, e até mesmo o que ela investe, todos os anos, em projetos sociais, desautorizam a pensar em enriquecimento ilícito, derivado desses poucos mais de R$ 220 mil que forneceu, em dois anos, ao Hangar.
O problema é que aqui não se discute o valor dessas transações – mas, a MORALIDADE delas.
Ora, o empresário Roberto Ferreira preside o Conselho de Administração de uma estrutura pública, na qual circulam milhões em dinheiro público.
E mesmo o dinheiro que ali entra, em torrentes, advindo da iniciativa privada, resulta da exploração de uma estrutura que pertence a todos nós (e, para se compreender bem isso, é o caso de se perguntar: que seria da Via Amazônia sem o Hangar?)
Por isso, não há, no Hangar, um mísero tostão que não tenha, geneticamente, origem pública.
Daí que, ao contrário do que acontece numa empresa privada, é preciso, sim, levar em conta, na gestão do Hangar, os princípios que norteiam a administração da “res” pública.
E, do ponto de vista da “coisa pública”, será moral que um administrador forneça produtos à estrutura que administra? Será impessoal a contratação de uma empresa que pertence a esse administrador?
O problema, parece-me, é a concepção viciada que temos daquilo que é público – e que, pelo visto, faz o cotidiano das relações no Hangar.
A “coisa” pública não é a quitanda de um compadre, na qual a gente pode mandar buscar um maço de cheiro-verde, para temperar o vatapá.
A coisa pública não é um pertence de um diretor, de um presidente, de um governador, de um prefeito, de um vereador ou de qualquer indivíduo – em si, por si.
A coisa pública, como o próprio nome diz, é algo que pertence a todos. A mim, a você, aos nossos filhos, aos nossos netos. Desde o cidadão que habita o humilde barraco da Terra Firme, até o dono da mansão bacana, lá em Batista Campos.
E eu fico pensando que esses R$ 220 mil podem não significar nada no faturamento de uma empresa como a Sol Informática.
Mas, podem significar MUITO para um cidadão, outro empresário do mesmo ramo, com uma empresa menor, mas que, infelizmente, não tem a sorte de pertencer ao Conselho de Administração do Hangar.
E eu fico pensando que, em se tratando da coisa pública, todos os cidadãos têm, sim, o direito de disputar contratos, em igualdade de condições.
Mas, não me parece que é de Roberto Ferreira ou mesmo de Thaís Montenegro que eu, cidadã, tenho de exigir tal compreensão.
Parece-me que quem tem de “meditar” acerca da moralidade e da impessoalidade públicas, é, justamente, o Poder Público.
Quer dizer: o Governo do Estado, por seus entes, o Executivo, o Ministério Público, o Judiciário, o Tribunal de Contas, a Assembléia Legislativa, que, no entanto, parecem ter estabelecido um pacto de silêncio em relação à LAMBANÇA que acontece no Hangar.
Quiçá, até, pelas poderosas verbas nas mãos do Executivo, que irrigam todos os demais entes desse arremedo de república em que vivemos.
E eu, cidadã, fico a pensar para que servem, diabos, o Ministério Público, o Tribunal de Contas, o Judiciário, a Assembléia Legislativa, se, apesar de todas as prerrogativas constitucionais de que dispõem, são incapazes de dar um pio em relação a essa “malemolência”, para dizer o mínimo, do Executivo, em relação ao Hangar.
O que vemos, hoje, no Hangar – e que este blog, sabe-se lá até quando, está a mostrar – é, apenas, a ponta do iceberg.
E eu até dizia, hoje, a um promotor – que não considero só um promotor, mas, um amigo – que já estou até começando a sentir medo de mergulhar no Hangar. Porque, se a superfície está assim, avalie o que não acontece nas profundezas, né mermo? Eis que o exemplo que vem de cima se reproduz em todos os patamares, né mermo?
Sei, apenas, que o “odor” que vem de lá, não é nada agradável...
E já começa a arrastar para o epicentro de um escândalo, talvez monumental, até mesmo um cidadão da estatura de um Roberto Ferreira.
E eu, jornalista e cidadã – sobretudo, cidadã; orgulhosamente cidadã! – só posso é lamentar que seja assim.
Só posso é pedir que Deus nos ajude, quando, afinal, conseguirmos abrir aquela caixa de Pandora.
Para que, no fundo, reste, ao menos, a Esperança.
FUUUUIIIIIII!!!!!!!
(P.S: O Hangar sempre foi complicado.
Na época da construção, foram muitas as denúncias de superfaturamento.
E eu confesso que, depois de muito vasculhar na internet, nunca consegui encontrar UM só centro de convenções do Brasil que tivesse custado tanto: R$ 107 milhões.
Pelo contrário: achei centros uns R$ 30 milhões mais baratos e que faziam o Hangar parecer uma caixa de fósforos.
No entanto, não sei se houve “crime” ali – mas, com certeza, houve, sim, megalomania.
E, num estado miserável como o Pará, isso se torna muito, muito mais grave. Até porque a megalomania com dinheiro próprio é uma coisa; mas, com dinheiro público, é coisa bem diferente.
Depois, veio essa história de uma OS, para administrar o Hangar. E eu não consigo conceber, por mais que me ponderem acerca da necessidade de “flexibilizar” a legislação, para a contratação de técnicos mais bem pagos; eu não consigo conceber a licitude dessa excrescência chamada OS.
Se a Lei é incompatível com a realidade, com a “frieza” do cotidiano, então, que se mude a Lei. Mas, construir artifícios para, simplesmente, burlar a Lei não é democrático, não é lícito, não é “normal”.
Em nenhum Estado Democrático pode ser “normal” investir milhões em uma estrutura pública, para, enfim, entregá-la a um ente privado, mesmo que diz-que sem fins lucrativos.
E, mais ainda, quando não há qualquer controle, DE VERDADE!, sobre o que se aufere a partir do uso dessa estrutura e que, ao fim e ao cabo, é, sobretudo, PÚBLICO.
E aqui eu não me refiro só à Via Amazônia. Refiro-me a todas as OS, como, por exemplo, àquela que administra o Hospital Metropolitano, a outra que conheço, também, um pouco melhor.
Até hoje, creio, os alunos da Uepa, uma universidade pública e da qual os alunos advêm, na maioria, de escolas públicas, não possuem um hospital universitário.
E, no entanto, a faculdade de Medicina administrada também pela Acepa possui um curso pelo qual cobra R$ 3 mil por mês e no qual o hospital-escola é, justamente, o Metropolitano.
Pode isso? Sinceramente, pode isso?!!!
É verdade: pode ser que, no futuro, quando eu estiver meio que bilé; meio que “meuã”, como diria a minha mãe; algum grande doutor, de alguma grande Academia, possa, enfim, explicar-me isso, tendo em vista a minha rude, parca intelecção.
Mas, até lá, confesso que, simples cidadã, não consigo encontrar justificativa para isso.
Só sei que as coisas estão nesse pé desde os tempos dos tucanos e se estendem ao xifópago PT: a gente constrói, com milhões, uma estrutura pública e diz a uma OS ou a um empresário: toma que o filho é teu!
Como se fôssemos, todos, uns retardados. E como se fosse moral, honesto, fazer algo assim. Agora, FUUIIIIIII!!!!)
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